Música

A influência de Funkadelic na obra de Childish Gambino

A influência de Funkadelic, comandado por George Clinton, é uma das forças mais perceptíveis na evolução estética e sonora de Childish Gambino. O coletivo pioneiro do P-Funk criou nos anos 1970 uma fusão psicodélica de funk, rock e soul que abriu caminhos para artistas interessados em ultrapassar as fronteiras tradicionais da música negra. Gambino, especialmente a partir do álbum Awaken, My Love! (2016), absorveu essa herança de forma direta — adotando timbres, harmonias e texturas que remetem ao clima experimental, cósmico e groovy que tornou Funkadelic uma das bandas mais visionárias da história.

O diálogo fica claro no uso de guitarras distorcidas, falsetes intensos e estruturas musicais que fogem do formato convencional do R&B contemporâneo. Em músicas como “Redbone” e “Boogieman”, Gambino recria uma atmosfera que poderia facilmente dialogar com clássicos como “Maggot Brain” ou “Cosmic Slop”. Não é apenas referência estética: é a busca pelo mesmo espírito libertário que guiava o P-Funk — uma música que não pede permissão, que desafia categorias e que amplia o imaginário cultural da música afro-americana.

Além da sonoridade, Gambino herda de Funkadelic a dimensão conceitual. George Clinton sempre tratou sua arte como um universo próprio, com personagens, mitologias e mensagens sociais camufladas em performances extravagantes. Gambino segue essa linha ao construir alter egos, narrativas visuais e críticas sociopolíticas que transcendem o “simples” álbum musical. O projeto visual e teatral de Awaken, My Love! ecoa esse legado: é mais do que música, é uma experiência estética completa que conversa com afrofuturismo, identidade negra e desconstrução cultural.

Por fim, a influência de Funkadelic aparece também na coragem criativa de Gambino. Assim como Clinton se recusou a seguir fórmulas, Gambino rompeu com o que o público esperava dele — abandonando temporariamente o rap tradicional para mergulhar em uma estética vintage-futurista. Essa ruptura consolidou sua reputação como um dos artistas mais versáteis de sua geração, e provou que o P-Funk continua moldando novas linguagens décadas depois. A conexão entre Funkadelic e Childish Gambino é, antes de tudo, um diálogo entre passado e futuro: a tradição da invenção reinventando-se mais uma vez.

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